Uns detalhes de nós

Você senta comigo num lugar qualquer e pede aquele milk shake de sempre. Se você não estivesse ali, eu saberia o seu pedido. Se você não sorrisse daquele jeito bobo, sem pretensão de ser grande, eu ainda te repararia por aí... Nas pequenas coisas, nos olhares desviados, num gesto envergonhado ou até num milk shake que, você sabe: eu detesto.

Nós não precisamos trocar beijos ou abraços. Isso fica para depois. Não precisamos de declarações a todo segundo como a necessidade de casais que se conheceram ainda ontem. Não precisamos nem falar de nós, pois sabemos que vamos bem, vamos indo, cavando nosso futuro no espaço. Acabamos nos encontrando em vidas alheias, vemos nossas coincidências, o seu gosto por chá e a minha preferência por café, a nossa paixão comum por livros ou qualquer coisa assim. Qualquer coisa pequena, qualquer "detalhe de nós dois". Enquanto o tempo passa, nós paramos: eu em ti, tu em mim. Paramos assim, do nosso jeito perdido de nos acharmos, entre risos e brincadeiras de casais que, enfim, não se conheceram ontem. Mas não estamos contado os dias, eu sei.

Nesses dias quentes demais eu poderia até chorar, nem todo dia a gente esquenta por completo. Porque há sempre um iceberg atrás dos nossos olhos. E você ainda diz numa madrugada dessas que eu sou mais frágil que flores de vidro... E acerta. Mas se eu desenho a dor, você vem e pinta o meu sorriso. Você chega devagar, quase pedindo licença, pensando que incomoda, e deixa leve todo o meu ar pesado e poluído. Você me carrega de mim e é por isso que eu te preciso aqui.

Numa dessas conversas com Deus - ou quem quer que seja - vou pedir sempre um banco para nós pelos cantos do mundo onde pisarmos. Um lugar para sentarmos e fingirmos que o relógio parou. Um milk shake para você tomar. Um suco cheio de açúcar para anteciparmos a diabetes. Um filme para discutirmos se eu falei dele para você ou não. Uma rua para nos encontramos e até um pouquinho de dor para você pintar... Uma chuva para dividirmos o tal do arco-íris, o guarda-chuva e a gripe. Um amanhã para você sorrir de novo e sempre e tanto e para mim.

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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.