Nós não entendemos de aviões

"Olha, pai, é grande mesmo!!"

O menino, espantado com a novidade ao vivo, grudava as mãos na grande janela e os olhos no imenso avião que se preparava para voar. Naquela espera, eu vi o tamanho de voar, e não era aquele avião menor para mim do que para aquela criança apenas por eu ser maior do que ela. "Ele voa mesmo", eu pensava, mesmo não sendo a primeira vez, tão inocente quanto qualquer um.

A senhora olhava atônita. Tentei ler os pensamentos dela, olhando aquele corpo já cheio de rugas tão paralisado frente àquelas máquinas que, ninguém entende como, riscam o céu infinito. Já deve ter visto muito nessa vida, e nunca entenderá de aviões. Talvez, acredito eu, pensava ela algo assim: "como é que essa coisa não cai?". O homem se encarrega, e eu não sei, juro, não sei como. A engenharia me despista demais. Para mim, é incompreensível que um peso daqueles possa voar e eu não. Eu, quase leve. Quase. No fundo, acho que é isso, que o céu não aguentaria o nosso peso sem ajuda.

Mais e mais crianças se jogam naquela janela de um aeroporto igual aos outros, olhando uns aviões iguais a todos. Mais e mais senhoras, senhores, jovens, experientes no assunto ou "marinheiros de primeira viagem". Como esse troço voa sem cair, meu Deus? Por que nós não voamos também? Ah, vai saber. Se voar é liberdade, por que nos prendem entre tantas janelas? Realidade enquadrada, sempre enquadrada, nunca completa. Nós nos acostumamos a ver vida pela janela. E tudo vira um avião.

E lá ia a criança, correndo pelo salão, acompanhando o partir do avião. Gigante que só ele... A criança, não o avião. Abriu os braços e imitou as asas do que enxergava. O gosto das nuvens ela nunca saberá. Como é quebrar a barreira do som, ela também nunca saberá. Como eu, a senhora, e todo mundo, nunca entenderá de aviões.

Por todos os lados alguém fixava os olhos na imensidão, na pista, no pouso... Por todos os lados alguém ia, vinha, esperava outro alguém; essas prontidões da vida. E não entendia, simplesmente não entendia o peso de voar. Ou a leveza. Ou, enfim, se algum dia ser leve será o bastante. Mas nós, moradores de aeroportos da vida, não somos aviões. E o nosso chão, distante do céu, nunca sabe até onde vai.

"Pai, ele tá voando, pai!"

E nós estamos no chão.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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