Espelho, espelho meu (teu)

Luz Dos Olhos by Nando Reis on Grooveshark
Você precisa saber que eu ainda não consegui me olhar no espelho. Que o gosto da minha decepção comigo é tão, mas tão amargo, que até a língua pediu uma trégua. Hoje, agora, eu não sei ser qualquer coisa além de alguém que se acha ainda menor do que o pouco que já é e que, mesmo assim, insiste em te levar.

Quando você cruzou as linhas, visíveis e invisíveis, quando escalou os altos muros, quando varreu a bagunça e trouxe cor nova às paredes, nem sabia o que estava fazendo. Fez todo esse trabalho quase sem querer fazer e sei que até hoje isso te confunde, e eu nunca, nunca tinha visto alguém assim, desse tipo que me vê mais como acerto do que erro. Essa cor dos seus olhos, esse escuro-quase-mel que me puxa e faz eu me enxergar no fundo dele é um antídoto contra o meu medo. Ele me leva ali, aqui, aí, onde bem entender. Aprendi a ir; não questiono nem a cor e nem o silêncios dos seus olhos.

O que eu não vi, entre tudo o que você me mostrou, foi a parte minha que descrê de tudo e todos, que vive a se conflitar com a minha esperança naquelas histórias bonitas como o casal que eu li esses dias completando 81 anos de casamento. Nessas horas, eu mal acredito em 81 horas, porque não acredito em mim. Mas quando você fica, mesmo com todos os motivos para ir, me faz questionar até as minhas mais antigas certezas e pensar que "a minha rua encostou na tua". Mas eu nunca tive rua, meu amor. Eu nunca tive endereço. No meio de tanta gente ruim, você resolveu me fazer bem. E, perdão, mas eu não sei reagir às coisas boas, é falta de jeito, de costume. Eu não sei entender porque você ainda não foi embora. Mas não vai, porque todo mundo vai e você não é todo mundo - eu não posso aceitar que seja.

Pra esse dia que chove-não-molha, pra essa vida que tropeça e se atropela, pra esse mundo que bate e apanha... Tudo isso tem conserto. Tudo isso se ajeita, a gente é que não quer ajeitar. O mar avança, a vida (me) erra, o mundo se perde, e a gente passa, fica, vai, volta, perdoa e pede perdão. E é no perdão que eu quero chegar: mesmo que eu não me perdoe, por favor, vê se me perdoa. Vê se deixa a chuva molhar, sim, porque não tem nada mais sem emoção do que não aproveitar aquilo que o céu nos dá. Deixe que tudo que se perca, mas te encontra em mim, porque eu posso até nos mapear. Por mais forte que seja a maré, eu ainda remo de volta pra (tua) casa.

E toda vez que o telefone toca eu receio que seja você me dizendo que um dia a gente se vê, mas não hoje... Nem semana que vem. Eu quero rasgar todos os calendário para nunca te perder te vista.

Nesse romance ideal de mil faces eu só peço que o meu espelho seja você.. Aí eu me vejo. Aí eu me encontro.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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2 comentários:

  1. "(...) mas eu não sei reagir às coisas boas..."
    Sua não-reação é o que há de melhor. Suas palavras enchem o coração através dos olhos... o resto... é resto.

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  2. "No meio de tanta gente ruim, você resolveu me fazer bem." Como não abraçar a sua multidão?

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