Quando fui sonho


           Era um sonho. Quando olhei para o lado e você não estava, soube que tudo havia sido um belo e distante sonho daqueles que deixa o coração acelerado e os olhos perturbados procurando o que antes estava ali, tão ao meu alcance. “Distante”, aliás, define metade de nós. A outra metade é branca, nao transparente, mas branca de uma forma que não nos permite uma visão além, é como uma parede, uma folha: branco total.
       
            No sonho as coisas eram mais claras como as águas de um paraiso. Você usava e abusava da sua voz suave para me dizer palavras soltas e bonitas, coisas que jamais me permiti ouvir. Emergiu de mim uma sensibilidade, um carinho que havia embrutecido e, pensara eu, esgotado-se. Mas você me reabriu as portas e recolocou as delicadezas na minha vida. Você rolava na cama rindo de mim e do meu jeito envergonhado e fugidio de ser. Você sorria e me paralisava. Nem via a sua cintura nua, nem reparava nas suas pernas esticadas: os meus olhos não saíam dos teus. Abraçava-me doce como quem proteje e livre como quem não sufoca. Abraçava-me, a mensagem era outro porém. Oferecia-me café e eu dizia ser tarde. Oferecia-me pão e eu dizia ser cedo. Oferecia-me o sorriso e eu não dizia: era simplesmente a hora certa.
       
           No sonho você ficava, preenchia a cama, esquecia as próprias chaves, imitava algum filme romântico que não assisti quando dava meia-volta e se pendurava no meu pescoço dizendo que não queria olhar o relógio. No sonho você era muito mais real e tateável. Nós nos comunicávamos muito mais dizendo “fica”, “volta”, “eu quero”, “me queira também”. Não tínhamos a velha mania de vamos-deixar-para-dizer-amanhã, e o amanhã nunca vinha; éramos diretos como há muito deveríamos ter aprendido. O seu nome estava riscado no canto das paredes, na madeira da mesa, nos meus papéis espalhados, no meio da porta e estampado em mim. Eu era coadjuvante, personagem que esperava apenas a sua solicitação, o seu chamado mais calado com o dedo me indicando uma ordem, inibindo qualquer recusa minha.
       
          Eu gosto de você, gosto dos seus olhos e gosto do seu sorriso. Eu não sei se você sabe, mas sonhei o que queria sonhar. Sonhei como quem comanda um sonho, mas precisa abrir os olhos à realidade. Sonhei para não te ver sumir debaixo do meu próprio nariz, porque é cedo e pode ser que ainda não seja a hora… Mas sonhar pode, sonhar é refúgio. Eu gosto da sua forma simples de dizer que gosta de mim e me repito toda vez que falo de ti. A minha casa está prestes a me expulsar por não me aguentar mais. Sei que você é um barco que navega sozinho e não atraca em porto algum, tal como eu, mas penso em rever todos esses conceitos.
     
          Eu já fui paixão, já fui ilusão, já fui decepção. Atualmente, sou sonho. Eu ainda não fui amor. No próximo sonho já sei o que ser. E nunca mais você terá saído de mim.
Compartilhar no Google Plus

Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
    Blogger Comment
    Facebook Comment

1 comentários: