Another night



Vamos voltar algumas páginas. Nós não paramos no mesmo parágrafo, tenho essa certeza enquanto tomo o meu café depois de uma noite sem dormir. E essa foi tão culpa sua quanto qualquer outra.

Parei uma quadra antes como você pediu, mesmo após insistir no telefone que ninguém ia te ver entrando no meu carro às 3h da madrugada. E, se vissem, era só uma garota e o melhor amigo. Era só eu e você, enquanto o seu namorado, como disse ao telefone alternando o choro e a respiração profunda, dormia bêbado ao seu lado. Lembro de ter me dito algo sobre ele não se importar em te abraçar para dormir e ter esquecido o aniversário de namoro. Acho que você me liga toda vez que quer um abraço para dormir. E eu nunca te neguei proteção.

Ao telefone você me perguntou se eu estava ocupado com alguém e fingi que não. Agora, tento me lembrar o nome daquela garota que se solidarizou quando eu disse que minha irmã mais nova estava em casa com medo de dormir sozinha. Mentiras à parte, eu sempre estou sozinho. 

Você não sabia para onde queria ir, apenas me pediu para ligar o carro e andar sem rumo. Seus olhos vermelhos das lágrimas me machucaram, mas eu não disse nada. Sua voz tentando se animar me entristeceu de um jeito atípico. Quis perguntar até quando vai se contentar com felicidades pela metade e madrugadas vagando com o cara errado, mas, de novo, permaneci calado. Num desses semáforos que a gente não faz questão de parar a essa hora por motivos de segurança, um carro quase nos cortou ao meio. Um susto. Você gritou e segurou forte o meu braço. Perguntei se estava bem e não poderia ter me respondido pior: "eu me assustei, mas sabia que você não ia deixar nada acontecer". Naquele momento eu quis arrancar a auréola imaginária que somente você vê acima de mim, mostrar que não sou o cara bonzinho dos filmes, que esse personagem que leva a amiga para o altar não sou, caramba, não sou!

Coloquei para tocar aquele CD que você fez especialmente para o meu carro. Dizia que era para eu lembrar de ti quando entrasse aqui com qualquer outra garota que estivesse tentando conquistar. Sempre me perguntei se daria certo com você. Te vi encostar a cabeça no banco, fechar os olhos e cantar baixinho aquelas letras que conhecia muito bem. E foi aí que eu parei, porque você estava na sua cena particular de um filme e eu não quis ficar de fora, não poderia. E desde o beijo naquele instante eu não sei mais em que contexto estamos.

Como foi a nossa conversa de despedida mesmo?

- Eu vou ser sempre a sua opção fácil?
- Você não é a opção fácil.
- É, tem razão. Nunca fui opção.
- Não foi isso que eu quis dizer...
- Esquece. Eu também não me escolheria.

Eu sei o que o silêncio e um beijo na testa significam nessas horas. Você fechou o portão do seu prédio como quem coloca um cadeado no peito. Não sei se expulsou o seu namorado bêbado da cama, se chorou mais um pouco, ou se foi beber um café como fiz. Eu, que decorei os seus passos, não faço ideia de qual caminho seguiu, muito menos de qual caminho seguir.

O meu único medo é que depois que a gente se perde, é sempre outro alguém que nos encontra. E não vai ser você. Nunca é, mas eu sempre quis que fosse.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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