Amor + adjetivo

O amor nos cobra adjetivos, como se sozinho ele nada fosse. Grande, pequeno, imenso, antigo, novo, passageiro, eterno, desgraçado, abençoado, tranquilo, conturbado. O amor nem é verbo e mesmo assim a gente insiste nos auxiliares, na estrutura gramática: amor + adjetivo.

É a idealização do amor. Mania dos novos tempos, ou será que sempre foi assim? Porque tem que ser uma coisa ou outra, como um ultimato. Ou não ser de uma vez para não desperdiçar energia. Imagino como era na época primitiva, lá nas cavernas. Tinha que ser amor, se não fosse, o homem sumia, trocava de caverna, a mulher procurava outro. Se fosse, ele caçava o maior animal da aldeia para ela. E assim vai, provas e provas de amor, tudo ou nada. Um monte de adjetivo quando nem se falava ainda.

Amor é para ser. Tudo aquilo que o verbo "ser" carrega deveria bastar, mas não há um ser - aí é da espécie humana - que se contente com o simples. Não há quem consiga amar assim, porque parece que se está nas beiradas, pegando para si o pouco que resta daquele muito. "Pouco" e "muito", aliás, também podem ser exageros. E o fato é: quem não exagerar, pode ir embora; as pessoas cansaram de quem se poupa - é a nova ordem.

O amor pede que a gente se entregue de corpo e alma. "Vai de cabeça." E, olha, cuidado para não mergulhar e descobrir que era fundo demais ou que a água disfarçava a superfície rasa. De um jeito ou de outro vai doer, vai deixar marcas. E aí você decide se vale a pena ficar ou não. Você decide, como aquele programa que dava na televisão nos anos 90. No amor a decisão também é sua. É que tem tanto sentimento nosso na mão do outro que o amor escapa para quem dorme no ponto ou muda sem querer de canal.

Mas tudo isso é pequeno, essas palavras são curtas demais. O amor, cheio de adjetivos, de grandes proporções, de impactos, de complicado ou nada, necessita urgentemente que nós estejamos focados. Se piscar, o adjetivo muda de lugar na frase: um grande amor/um amor grande. E quem sabe qual é suficiente? Quem sabe qual é eterno e qual é passageiro? Quem sabe qual faz sorrir e qual faz chorar?

Tudo isso é porque o amor é companhia muito mais do que se insiste na solidão. Ele é claro, mas a gente não vê na escuridão. É limpo, mesmo nesse mar de sujeiras. E tão, mas tão grande, que precisa de mais sílabas dentro do coração. Ele nunca foi um só.

Na confusão de se gritar, o amor ficou perdido no silêncio que somente os olhos apaixonados sabem escutar. Fica escondido o amor calmo, tranquilo, quentinho... Os adjetivos que nos gestos encontram a sua fala perfeita.

(Por via das dúvidas, se não estiver fazendo nada, fica por aqui... Vem ser o adjetivo do meu amor.)
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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2 comentários:

  1. É bem verdade. Ninguém se contenta com o fato de só amar. Tem que exagerar nos adjetivos, nas maneiras de demonstrá-lo...
    Boa noite. Bjos.

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