Tudo o que não sabemos falar


Claro que eu queria receber uma linda e completa declaração de amor. Claro que a minha veia romântica também adoraria fazer uma. Mais claro e óbvio ainda que gostaria de parar na frente de algumas poucas e importantes pessoas e dizer algo bonito e verdadeiro como “eu só preciso de você sempre ao meu lado”. Não é assim que as coisas acontecem. Ninguém consegue sair dizendo tudo. Essas coisas todas exigem muito mais do que só abrir a boca e falar. Sempre tem o outro na história e nós nunca sabemos o que ele pode fazer. Não é tão espontaneamente e nem tão abertamente que os sentimentos se revelam. Aliás, não é assim tão fácil que nós nos revelamos. E o medo filho da puta de dizer oi-eu-faço-tudo-o-que-você-pedir e levar uma apunhalada nas costas? Não, é preciso pé atrás! Não é assim que pensamos? Não é esse medo tão dominador que nos faz refém da intensidade de coisas grandes e boas que sentimos? É difícil demais entregar o que pensamos, o que somos e o que sentimos bem lá no fundo onde quase ninguém chega. É que dá medo demais entregar o coração nas mãos dos outros. Dá medo demais deixar a outra pessoa saber aquele trauma que a gente tem. Dá medo pra caramba dividir as angústias. Dá medo de se mostrar, não é? Tudo bem, comigo é assim também. Eu tenho essa dificuldade de me entregar às pessoas. Muito é culpa do quanto já me decepcionei. O outro muito é culpa do medo, do pé atrás, da falta de jeito, de tudo e mais um pouco.

Relutamos até o último instante. A maioria só diz “você é o amor da minha vida” depois que vê a possibilidade de perder para outra pessoa. Hoje em dia eu mal sei dizer um eu te amo. Não que eu não sinta, porque sinto uns até demais. Acontece que perdi o jeito, perdi a confiança de estar falando na hora certa. Porque até hora certa a gente acha que essas coisas tem que ter. Enrolamos, complicamos, dificultamos e escondemos até sufocar. Às vezes nos importamos tanto com alguém que não sabemos como demonstrar ou falar isso. Sentimento, carinho e amor demais, assustam. Isso deixa a gente com medo – ele de novo – de perder o controle. Você sabe, e se não sabe pode cair na real, que nenhum de nós consegue ter controle do que sente. Uma hora, nem que seja em meio à raiva, você vai berrar pela primeira vez que ama. Um dia, quando estiver tentando viver mais para si mesmo, você vai se ver largando tudo sem pensar duas vezes para ajudar um amigo. São as declarações de amor mais bonitas que existem. São as entregas mais inteiras que se pode ver. São aqueles momentos em que você não percebe, mas entregam metade do que você guarda a sete chaves.

O coração de todo mundo tem marca. Feio mesmo é um coração intacto. Tem que ter remenda, cicatriz, sangue exposto. Tem que ter tudo isso para avisar que já sofreu demais a ponto de não querer fazer sofrer e nem repetir o sofrimento. Essa marca que talvez ainda te faça chorar é só uma recordação do tanto que você armazena de outras histórias. É só a marca de quem não teve medo e se jogou de cabeça. É válido, é sempre válido. Quem se joga uma hora acerta o pulo, sabia? Eu vou trabalhando nessa minha falta de jeito, nessa minha reluta em dizer isso ou aquilo... Vou tentando não me cortar tanto, mas não me fechar demais também. Equilíbrio não dá porque essa coisa de tirar as cordas e cadeados do coração sempre é extremista demais. Vou protegendo alguns cantos e abrindo outros. Vou revezando para ver até onde aguento e consigo dizer que eu-amo-mais-do-que-a-margem-segura-permite. Talvez um dia eu até seja capaz de ligar para alguém no meio da noite e dizer que o meu sono tranquilo dependia daquela voz ou que ando precisando de ajuda. Falar que preciso de ajuda é meu maior problema. É dizer que depende, dizer que a importância é grande, que extrapola o viver sozinho. É dizer tudo de si e do outro. Não consigo. Um dia, quem sabe, eu volto a deixar o coração berrar tão alto assim.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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