Do olhar ao altar



Ela era uma princesinha, até ele fazê-la "descer do salto". Ele era frio, até ela derretê-lo. Foi assim que dois opostos tão indispostos se cruzaram. Indispostos sim, porque ela não queria. Ele? Menos ainda! Um dia a porta do elevador simplesmente abriu e pluft! Colidiram! Ela, perfeitamente arrumada para a reunião, deixou o café cair na saia. Ele, habitualmente atrasado para a entrevista de emprego, já se preparava para mandarem sair da frente. Foi então que os olhares resolveram cruzar-se. Meus avós diriam: desse mato sai coelho. Eu digo: desses olhares sai amor. Não pense que se beijaram e usaram o elevador para palco de suas fantasias sexuais. O momento ficou um pouco conturbado. Ele perdeu a voz com aqueles olhos escuros tão fortes o analisando. Ela não conseguia pensar nem na saia e nem na reunião quando sentiu aquele perfume dele de... De quê mesmo? Ah, sim! Cheiro de homem! Mas esse cheiro cafajeste, conquistador e enganador ela já conhecia. Caiu no de vários. Diria que o do Marcelo era até doce, mas se revelou amargo. O do Bruno era forte, e acabou tão fraquinho que mal completou uma semana. O desse, ainda sem nome, ela reconheceu como inicialmente viciante, mas possivelmente traidor. Era de se manter distância. Ele não sabe bem o que reconheceu nela. Talvez o jeito tenho-estilo-mas-sou-certinha meio parecida com aquela ex-namorada... Aquela... Qual o nome mesmo? Ah, não vem ao caso! Devem ser todas iguais.

Ele deu o pontapé inicial na discussão e perguntou se ela não tinha educação suficiente para esperar os ocupantes deixarem o elevador. Ela não sabia o que responder. Nunca foi de falar alto com ninguém. Não que fosse alguém fácil de manipular ou que tivesse personalidade fraca, muito pelo contrário, era mulher forte o bastante para nunca precisar levantar a voz. Não se sabe bem o que houve, mas ali, na intensidade daqueles olhares, ela simplesmente levantou o tom de voz e disse que aquele elevador era exclusivo para funcionários e o errado ali era ele e não ela, afinal, os homens sempre acabam errando os buracos em que entram mesmo. Chamou atenção de todos naquele andar. Ninguém tinha visto alguém tira-la do sério. Ela era a advogada mais exemplar e de punho forte da empresa, mas nunca, jamais precisou falar alto. Todos entendiam o seu forte olhar. Ele não entendeu. Ou melhor, não obedeceu. Atreveu-se a dar uma risada da situação em que ela mesma se colocou e saiu, crente de que pegaria o emprego e aquele seria o início de uma guerra. No outro dia encontraram-se novamente. Dessa vez, porém, os dois – sozinhos – dentro do elevador. Ela fingiu indiferença. Ele sorriu e disse algo como “bom dia, colega de trabalho”. Dessa vez ela preferiu olhar para ele, sorrir e dizer “bom dia, querido”. Aquele sorriso. Ele conhecia o sorriso de várias mulheres. Ele fez surgir sorrisos em várias, mesmo nunca fazendo questão de morar neles. Mas aquele era diferente. Não era nem um olhar de desesperada por um casamento e nem um olhar de louca por uma noite. Era algo a mais. Um a mais que ele ainda não tinha provado. O cafajeste perfeito, coração de gelo, começou a se derreter. O jogo havia empatado.

Uma vez dividiram a sala do almoço. Conversaram rapidamente. Ela com a certeza absoluta de que ele nunca passava de um dia com uma mulher. Ele convicto de que ela não fazia o seu tipo. Ele acumulava o lixo de casa por dias. Ela não deixava nada fora do lugar. Ele tinha as cantadas mais eficazes; ela, os antídotos mais fortes. Volta e meia ele chegava atrasado ao trabalho, mas conquistava todos com o seu bom humor. Ela não tinha um atraso no histórico e era discreta nos cumprimentos, ainda que sempre gentil. Ele passava os fins de semana enchendo copos em festas. Ela passava quieta no seu apartamento lendo um romance bobo qualquer. Não era santo, e nunca fez questão de ser. Não era santa, mas nunca fez questão de espalhar. Ele cansou de acordar com ressaca todos os domingos e o coração vazio. Ela cansou de só ler romances e nunca achar o seu final feliz. Engraçado, pensavam ao mesmo tempo, nunca foram de sentir isso antes. Nunca antes... daquele olhar.

Hoje, cinco anos depois, a filha deles nasceu como ele queria: com os olhos da mãe. Nasceu também como a mãe queria: com o sorriso natural do pai. Eles ainda são opostos. Ela ainda faz ele se derreter e ele ainda consegue tira-la do sério, mas nada que não aqueça o amor. Um dia ele foi o cafajeste que se deixou ajeitar por uma princesinha. Um dia ela foi uma princesinha que se deixou levar por um cafajeste. Hoje eles são o amor. O improvável amor de um elevador.

E agora, você vai mesmo achar que não pode tropeçar com o seu futuro a qualquer hora do dia e da noite? Não sabemos, mas vamos todos dos olhares ao altares em cenas mais rápidas que a batida de um coração.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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4 comentários:

  1. Lindo!!! Me emocionei muito com esse texto! Posso divulgá-lo em meu blog?
    Bora torcer para esbarrar no amor por aí...♥

    www.gabymenddes.blogspot.com

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  2. lindo, amei eu tbm quero divuga-lo no meu posso?? amei mesmo. que Deus continue abençoando!

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  3. Perfeito!! Lindo demais <3

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  4. Eu amei , tmb gostaria de de colocar no meu novo blog ( www.tercademaio.blogspot.com) , eu achei muito legal o seu blog tmb , achei inspirador , não pare de posta gostei muito :)

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