Olhos, olhos...



Eu gostaria que todos conhecessem a história de Evgen Bavcar como eu acabei conhecendo. Por que? Ele é o cara. É “o cara” daqueles que realmente enxerga as coisas muito além do que elas são, transpondo os limites. Ah, Evgen Bavcar é cego. Sofreu dois sérios acidentes na infância e nunca mais sua visão voltou. Ele também é fotógrafo Interessou-se pelas máquinas que chegavam ao seu país e tratou de aprender a técnica. Cego e fotógrafo, enxergando tudo muito longe. A condição de Bavcar me fez perceber o quão cegos somos nós, isentos de maiores deficiências visuais. O quão limitada e filtrada - não positivamente - a nossa visão acaba por ser. A sensibilidade vive nos escapando por ser exatamente aquilo que os olhos não captam.

Bavcar não teve medo da sua condição, e, se algum dia teve, superou. Enquanto isso, eu vejo olhos transbordando medo todos os dias nas ruas. Ligados ao medo, ao visível, a multiplicidade de tudo o que vemos diariamente, acabamos pequenos, e somos pequenos exatamente por vermos demais, por no fim das contas vermos apenas aquilo que queremos ver e deixarmos de sentir, de perceber e atentar aos outros sentidos.

A nossa visão é um grande e confuso filtro que vê apenas aquilo que quer e limita a imaginação de ir adiante e “transver” o mundo. Nada é como se apresentar para nós, mas nos acostumamos a aceitar e condicionar a nossa imaginação a paralisar ali mesmo. O mundo, feio ou bonito, não se vê somente pelos olhos.

Evgen Bavcar trabalha com fotos em preto e branco. Foto belíssimas como esta acima, sensitivas demais para qualquer um de nós. Acerta em cheio todo foco que a imaginação o permite e sente o mundo em volta ao invés de somente enxergar. É consciente de que é preciso enquadrar as coisas e cores de outras formas, as quais nós não nos permitimos justamente por enxergarmos demais e confundirmos os fatos e as coisas.

Eu sempre tive medo de perder a visão, seja pelo motivo que for, e nunca soube bem o que ocorria no mundo dos ditos cegos. Hoje, sei que sou cega e eles não. Sem demagogias, não digo que todos deveríamos ser como eles, nada disso, que cada um lide com o seu “porém” na vida como Bavcar fez. O ponto que busco é: se temos olhos “perfeitos”, por que os usamos tão mal? Por que a mania de nós apenas enxergar? O mundo é outro nos olhos da alma. A visão que Deus nos abençoou vai muito além dos olhos, passa pelas mãos, cheiros, sons, gostos, entrelinhas de uma vida inteira e torta. Abraços e beijos são dados de olhos fechados, quem precisa ver para saber e sentir? A verdadeira visão bate lá na porta do coração e pede para entrar e ser, antes de tudo, sentida.

Em uma semana, ouvi falar duas vezes do então desconhecido Evgen Bavcar. Passei a entender porque é importante dar sentido aos nossos sentidos.

O que vemos é um mero espelho do mundo. Mas quem é que precisa de um espelho para se enxergar?
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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